domingo, 10 de outubro de 2010

Lembranças de um domingo



por Eduardo Cozer

Ainda lembra-se com assombrosa riqueza de detalhes. Tudo naquele dia parecia especial, até mesmo um velho ordinário com as mãos nos bolsos atravessando uma rua qualquer sem fazer nada demais. Nunca se esqueceu do velho, pois até ele fazia questão de participar do grande evento.

Era primavera e a brisa leve fazia as folhas de castanheira farfalhar. Sentiu um arrepio na nuca enquanto registrava no seu córtex cada milésimo de segundo vivenciado, empoleirada nos ombros do pai. Sua cabeça girava e gravava os acontecimentos ao seu redor. Tudo era igual e, ao mesmo tempo, novidade.

A textura das bandeiras, suas cores vibrantes e a maneira como davam forma ao deslocamento de ar. Eram azuis, eram vermelhas. O asfalto e as calçadas repletos de papeizinhos espalhados. O ar da primavera enchia seus pulmões e sentia-se disposta a cantar.

Vez ou outra algum sujeito desconhecido lhe dirigia o olhar e fazia alguma gaiatice, mexendo as sobrancelhas ou algo do gênero. Lembra-se claramente que alguns deles falaram com seu pai. Pudera, o assunto era o mesmo entre todos os passantes. Alguns até se arriscavam a predizer o resultado. A massa caminhava apressada em uma só direção e era reconfortante se sentir parte do todo. Próximo a entrada, viu alguns policiais, que detiam alguns sujeitos fanáticos e mais exaltados.

Então, posicionou-se na longa fila com seu pai. Entrou. A adrenalina no auge. Esperança no coração! Dos ombros do pai, pôde ver todos aqueles rostos que já tinha visto anteriormente na TV. Aperta “confirma”. Ela tinha apenas nove anos. Era a sua primeira vez na Festa da Democracia e mal podia aguardar sua vez de votar.

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